Na noite do dia 20 de maio, com o auditório central da Unisinos lotado, teve início a XI Semana da Imagem na Comunicação, cuja palestra de abertura esteve a cargo do antropólogo e pesquisador italiano da Universidade de Roma e professor visitante no Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP,? Massimo Canevacci.
Na sua apresentação, o pesquisador fez uma série de montagens de imagens provindas dos mais diversos campos, como a arte, a moda, as cidades e a arquitetura. O objetivo foi demonstrar que a comunicação digital possibilita uma série de montagens inesperadas que nos causam estupor por nos colocar em contato com o estranho, o estrangeiro. Ele destacou a necessidade de aprender a olhar como treino fundamental de uma etnografia. “Nosso corpo devia ser pensado como um corpo cheio de olhos. Olhos que nos levam a um estupor eróptico, um estupor metodológico”, disse Canevacci, criando um termo que une o erótico e o óptico e refere um tipo de olhar que se deixa atravessar pelo objeto e o atravessa.
Ele destacou como o nosso olhar está culturalmente determinado, por isso a necessidade de aprender a olhar. “Cada pessoa precisa treinar seu olhar. Não é um ato simples, a maneira como olhamos na publicidade ou no ao vivo não é ‘natural’. A primeira operação na comunicação é fazer-se olho, transformar a composição corporal no olhar. Olhar é uma dimensão reflexiva: aprender a olhar é também aprender a se olhar”, defendeu o professor.
Canevacci lembrou que a etnografia, um tipo de pesquisa que nasceu na Antropologia Cultural, se libertou dela e agora pertence a todas as disciplinas, tornando-se uma indisciplina que se propõe uma pesquisa de campo. “A etnografia? ? encontra seu desafio no descentramento de cada pesquisador. De outro lado, a ubiquidade é um desafio da cultura digital. Cada pessoa tem uma mistura de tempos e espaços que não é mais o tempo-espaço tradicional. A nossa subjetividade é ubíqua, eu não tenho mais só uma identidade”, lembrou o antropólogo. Ele destacou a necessidade de a universidade atualizar a teoria crítica, tentar permanecer além do que está acontecendo. Uma universidade que também se torna olhos.
O pesquisador assinalou o estupor como um posicionamento corporal aberto a um encontro com algo que não se conhece, mas se deseja. Algo estranho ? cultura do indivíduo é porque é estranho ao desejo. “O mais lindo que pode acontecer é encontrar o desconhecido, o estranho, e a metodologia do estupor nos ajuda a estarmos abertos. O estupor penetra em quem vê, mas também o que é olhado. A obra de arte é tal porque modifica nossa personalidade. A arte nos penetra e a penetramos”, explicou.
O palestrante apresentou alguns realizadores de imagens que considera filósofos, como a arquiteta Zaha Hadid, que transforma o sentido da metrópole e cria outro tipo de arquitetura com? conceitos como hibridização, deformação, interação e geração ou criação. Para ela, a arquitetura é um sintoma impuro que constrói uma obra de arte. “É a crítica ? arquitetura euclidiana, ? geometria euclidiana que é aparentemente objetiva. Devemos colocar em crise essa geometria”, defendeu o palestrante.? Para ele, a diagonalidade da artista cria a exclusão de um espaço normal e constitui uma ecologia do estupor.
Ao analisar as diversas imagens que apresentava, Canevacci destacou que o? digital permite colocar em crise a dimensão dicotômica e dualista. Como resultado dessa superação, ele percebe que a pesquisa atual mistura a dimensão aurática com a reprodutibilidade.
Para encerrar, Canevacci se referiu a Kairós como um tempo irregular, uma divindade que só tinha cabelo na frente e que em lugar de caminhar, rodava. E que é preciso agarrá-lo porque passa uma única vez. Nesse sentido, mostrou as esculturas de Nele Azevedo, uma artista brasileira que cria pequenas estátuas de gelo idênticas e as coloca nos degraus de uma escada. Cada forma vai descongelando-se e fica uma diferente da outra. “A performance dura meia hora. É um tipo de sugestão profunda: aprender a descongelar-se. Temos elementos congelados, bloqueados. Uma identidade que se descongela e uma identidade que olha. A maneira de olhar, ela me olha e me disse Massimo aprende a descongelar-te porque tu não podes ficar sempre o mesmo. A escultura se modifica e no final é água: uma clara metáfora da vida”, concluiu o palestrante.