O segundo dia da XVII Semana da Imagem contou com a exposição das teses de Magda Ruschel, O silêncio retratado em imagens fílmicas, e de Marcelo Salcedo Gomes, A Rosticidade da Tecnocultura na Galáxia National Geographic. Ambos doutores são egressos do PPG de Comunicação da Unisinos na linha de pesquisa de Mídias e Processos Audiovisuais, e membros do Tcav.
Magda Ruschel iniciou sua exposição descrevendo os dois momentos-chave que a sensibilizaram para pesquisar o silêncio. No primeiro, estava no metrô em São Paulo e percebeu com atenção o agir do vento, causado pelo movimento dos vagões, sobre seu corpo. No segundo, estava em um restaurante no morro da Borússia, Osório-RS, local de silêncio e calmaria, quando diversos motoqueiros passaram por ali, ocupando sonoramente o lugar. Quando seguiram adiante, o som permaneceu por alguns instantes, mesmo que as máquinas já tivessem ido embora.
Magda Ruschel tem seu percurso permeado pelo trabalho e fascinação com o som. Previamente trabalhou em estúdios e hoje é a professora da disciplina de produção em áudio do curso de Publicidade e Propaganda da Unisinos, dentre outras. O interesse pelo som não deixa de se manifestar por meio do seu olhar e ouvidos atentos às construções de silêncio no cinema, que investiga na tese.
Esta foi uma das primeiras descobertas na trajetória da pesquisa de Magda: a constatação de que o silêncio, no cinema, não é a ausência de som, mas a construção sonora da sensação do silêncio. A verificação é técnica. Magda extraiu a faixa de som de filmes e observou que os momentos de silêncio têm registro sonoro. O mais curioso dos casos é o filme Gravidade que, apesar de ter um registro muito tímido de som, ainda assim possui frequências sonoras que afetam o corpo do espectador.
No decorrer da pesquisa, Magda se inclina, então, à investigação das imagens de silêncio a partir da análise de quatro filmes: The Fall (2006), O Silêncio (1963), Gravidade (2013) e Aningaaq (2013). Para desenvolver a pesquisa, Magda articula o método intuitivo de Henri Bergson (2006), as cartografias de Walter Benjamin (2006) e a metodologia das molduras de Kilpp (2003, 2010).
As imagens médias selecionadas nas cenas de silêncio destes filmes, com recortes orientados pelo desenho de som deles, Magda organiza três constelações de imagens, a Sucessividade em O Silêncio, a Simultaneidade em Gravidade e a Espessurização em Aningaaq. Com a progressão da pesquisa, ela identifica ainda os retratos do silêncio, organizando-os em Expressões do Silêncio, Salões do Silêncio, Códigos de Silêncio e Espessuras de Silêncio.
Ao final da exposição, Magda propôs um exercício: “ouvir” o silêncio de imagens fotográficas selecionadas pela pesquisadora. O exercício gerou reflexões e perguntas que puderam ser relacionadas com a pesquisa. A fala de Magda e as perguntas realizadas estão disponíveis no Facebook do TCAV. Realizamos uma rápida entrevista com a dra. Magda Ruschel a fim de refletir sobre a Semana da Imagem e a contribuição de sua pesquisa para a comunicação no Brasil.
TCAV – A Semana da Imagem tenta exercer uma prática de trazer pesquisadores para refletir vários produtos contemporâneos das audiovisualidades junto à comunidade de alunos de graduação e pós-graduação da UNISINOS, como tu percebes tal oportunidade de troca?
MAGDA RUSCHEL – Mesmo tendo defendido faz dois anos, agora que sinto estar preparada para falar, apresentar e principalmente debater com outros colegas sobre a minha pesquisa. A semana da imagem é um momento especial diante disso é acho que cada vez mais a Linha 1 está na visada de muitos alunos da graduação em função dos autores que trabalhamos e dos objetos que inventamos. Muitos alunos têm me procurado e agora depois da semana desse ano, muitos outros tem me questionado sobre os autores, os projetos e professores da linha. Estão muito interessados principalmente nos processos metodológicos que criamos.
TCAV – Como tu enxergas que o compartilhamento da tua trajetória de pesquisa e do que tu pretendes pesquisar pode contribuir (ou já contribuiu) para novos olhares sobre a pesquisa em comunicação no Brasil?
O pesquisador Marcelo Salcedo Gomes fez a segunda fala da noite, com sua tese de título A Rosticidade da Tecnocultura na Galáxia National Geographic. Marcelo elaborou sua fala tecendo comentários sobre o que estudou anteriormente, durante a graduação e dissertação, e como costurou a pesquisa até o estágio atual. A revista National Geographic o acompanha como objeto empírico desde 2010. Ao iniciar a fala, também reiterou a importância de ter bolsas de incentivo à pesquisa para auxiliar nos anos de estudo.
Marcelo mostra apreço pelo tema da fotografia. Seu percurso acadêmico é permeado pelos diversos usos e leituras dos devires visuais suscitados pelo assunto. Através da curiosidade pela forma, o pesquisador consegue investigar sob diferentes prismas as aplicações das imagens na revista National Geographic, passando pela curiosidade sobre uma suposta aparência fantástica, aos retratos de natureza comunicacional e ao devir rosto, tema da apresentação da noite.
O conceito de rosticidade, usado pelo autor, é descrito como uma qualidade comunicacional que se atualiza em imagem-rosto. O rosto pode ser tanto humano, quanto qualquer outra coisa tomada como rosto. Como problema da pesquisa, Marcelo se questiona como a rosticidade da National Geographic comunica sobre a rosticidade da tecnocultura e, mais especificamente, o que e como a capa da revista, enquanto rosto, comunica sobre a própria revista e o dispositivo midiático.
Os conceitos da pesquisa se concentram nas questões do rosto como imagem de caráter especial (Walter Benjamin, Gilles Deleuze, Massimo Canevacci e Béla Balázs), de memória, duração percepção e imagem (Henri Bergson) e de tecnocultura (temas centrais nas pesquisas do TCAV). Os métodos articulados na pesquisa foram intuição, cartografia e metodologia das molduras.
Realizamos uma rápida entrevista com o Dr. Marcelo Salcedo Gomes a fim de refletir sobre a Semana da Imagem e a contribuição de sua pesquisa para a comunicação no Brasil.
TCAV – A Semana da Imagem tenta exercer uma prática de trazer pesquisadores para refletir vários produtos contemporâneos das audiovisualidades junto à comunidade de alunos de graduação e pós-graduação da UNISINOS, como tu percebes tal oportunidade de troca?
Marcelo – A Semana da Imagem da Comunicação proporciona, na minha percepção, uma oportunidade ímpar para o diálogo entre os pesquisadores e os interessados na problemática da imagem em seus diversos aspectos. O maior diferencial do evento talvez seja uma abordagem que reflete, em boa medida, algumas proposições da linha de pesquisa Mídias e Processos Audiovisuais e do Grupo TCAv, que torna operacional a noção de audiovisualidades e compreende que o estudo da imagem, por um lado, pode ser transversal às diversas mídias (TV, cinema, fotografia, web…) e, por outro, contemplar questionamentos de múltiplas dimensões (culturais, sociais, artísticas, técnicas…). Neste sentido, a Semana da Imagem, seja na sua versão com convidados externos à universidade, seja na versão com os pesquisadores locais, constitui-se de uma oportunidade de encontro, discussões e aprendizagem para todos aqueles interessados na qualificação do conhecimento a respeito da imagem (latu sensu) e dos elementos que a compõem, que se relacionam com ela e que lhe dão sentido. Sendo assim, considero que a comunidade acadêmica tem contribuído para a relevância e abrangência do evento. Os estudantes de pós-graduação nutrem-se e contribuem com questões transversais a suas próprias pesquisas em andamento e os de graduação trazem um olhar renovado, muitas vezes com perspectivas que ajudam o pesquisador a perceber coisas que o envolvimento profundo com o objeto oblitera.
TCAV – Como tu enxergas que o compartilhamento da tua trajetória de pesquisa e do que tu pretendes pesquisar pode contribuir (ou já contribuiu) para novos olhares sobre a pesquisa em comunicação no Brasil?
Marcelo – Considero primordial o compartilhamento da pesquisa não só com os pares (que estudam as mesmas temáticas), mas também com o maior número de pessoas da comunidade. Um projeto de conhecimento, em última instância, precisa ajudar as pessoas a compreenderem melhor algo. Nas Ciências da Comunicação, como nas chamadas humanidades de modo geral, os resultados obtidos muitas vezes não se traduzem em conhecimentos de ordem prática imediata, daquilo que precisamos para agir no presente, mas produzem conhecimento sobre problemas complexos que se transformam a todo momento, como é o caso das imagens e seus significados para o humano. Desta forma, torna-se importante trazer um pouco da trajetória da pesquisa e do pesquisador para que as pessoas interessadas pelo trabalho possam acompanhar o caminho percorrido e entender melhor a motivação de certos questionamentos que se faz ao objeto, o porquê de certas escolhas teóricas e metodológicas, das dificuldades e dilemas que fazem parte da investigação e, finalmente, compreender de forma mais abrangente a importância da construção dos conceitos, das proposições e dos resultados. No que diz respeito à pesquisa desenvolvida na minha tese, penso que o conceito de rosticidade pode contribuir com as pesquisas no campo da comunicação ao considerar o significado da pregnância de certas imagens-rosto disseminadas tecnoculturalmente como marcas de um imaginário que autentica aquilo que se quer reconhecer como singularidades nas mídias. As imagens-rosto atualizam metaforicamente outras imagens e a rosticidade é a transformação destas imagens no tempo. A rosticidade diz respeito ao próprio movimento que carrega em si todas as lembranças, qualidades e contradições do objeto e, por esta razão, não pode ser percebida diretamente e fisicamente, apenas deixa seus rastros metaestáveis em imagens, através da metáfora do rosto, porque o rosto é uma imagem que conhecemos afetivamente. Como hipótese heurística, a rosticidade pode ser usada como alternativa de investigação que privilegia as qualidades propriamente comunicacionais dos objetos de estudo. No lugar de assumir, a priori, epistemologias de outros campos (filosofia, sociologia, antropologia, psicologia, artes, tecnologia, etc) para pensar os problemas da comunicação, passa-se a perceber as especificidade destes campos e dos vários domínios que atravessam o objeto através do estudo de sua rosticidade (que compõe o processo de transição entre estes campos e domínios). A rosticidade é aquilo que resta da imagem, mesmo quando esta já se extinguiu materialmente.
A exposição de Marcelo pode ser assistida no Facebook do TCAV.
Deixe um comentário
Você precisa fazer o login para publicar um comentário.