Madylene Costa Barata defendeu sua dissertação “NARRATIVIDADE SOFTWARIZADA: travessias no “Eu sou Amazônia”, do Google Earth”. Sua banca foi realizada no dia 6 de março de 2020.
Sua pesquisa buscou compreender como as narrativas podem ser pensadas diante de uma sociedade softwarizada. A partir de Benjamin, Madylene reconhece a potência comunicante da narrativa, que visa transmitir mais do que o dado ou informação puros. Percebeu que a narrativa se desdobra em diferentes formatos, desde o oral até os mais diferentes produtos midiáticos possíveis – como podcasts e hiperlinks. Optou então por mergulhar na forma do software, reconhecendo o pensamento de que as relações são mediadas em uma sociedade softwarizada e outros tipos de narrativas podem acontecer. Busca seu objeto de pesquisa no empírico “Eu Sou Amazônia” do software de geolocalização Google Earth.
Percurso e experiência de pesquisa
Para ela, o percurso do mestrado revelou as especificidades da investigação científica.
“Aprendi a investigar, a ler e a escrever pesquisa, porque ler e escrever pesquisa é muito diferente do meu fazer profissional como jornalista e realizadora audiovisual. Pesquisar me leva para o campo que tenho que ir mais a fundo nas leituras, nas discussões, nas indagações, nos tensionamentos e no compartilhamento de ideias”.
Investigando a narratividade softwarizada, ela também aprendeu a pensar e fazer pesquisa a partir das suas vivências. Antes de ingressar, Madylene imaginava à distância, que as pesquisas da linha talvez se detivessem exclusivamente sobre questões estéticas e da materialidade dos dispositivos e produtos comunicacionais audiovisuais.
Porém, ao estudar e debater os autores trabalhados, alcançou outra percepção. “A pesquisa vai mais a fundo, também para o campo da filosofia, para o campo social, e para um campo pessoal de conhecimento. Então quando eu falo de um projeto que envolve a amazônia visualmente, não falo apenas da estética, que por si só já seria bastante interessante. Eu falo também de questões que estão intrínsecas no objeto: questões sociais e de memória. E quando falo de memória, trago também as minhas memórias, que vivi e a partir das quais eu pude produzir conhecimento”.
“Eu olho pra amazônia que está ali e eu me olho. Me enxergo por todos os tensionamentos que fiz a partir do ‘Eu Sou Amazônia’. Isso me leva agora à questão ‘o que é ser amazônida?’”
Madylene precisou alternar a visão de vivência pessoal e o olhar estrangeiro sobre o empírico. por um lado ele era familiar, mas também era a Amazônia em outro território, o do software.
Laboratório de Travessias em busca da Narratividade Softwarizada
Para perceber e dar a ver as formas de narrar do software, Madylene criou o laboratório de travessias. Nesse momento da pesquisa, o termo “travessias” é um modo de perceber ou de produzir fluxos e movimentos na materialidade. No laboratório, ela buscou perambular pelo seu empírico, não apenas preocupada com os lugares de saída e de chegada, mas observando o próprio passeio. Parava o fluxo da travessia, olhando para e cartografando imagens, telas, montagens espaciais e montagens temporais do empírico. Em um mergulho desatento, fora do contexto da pesquisa, elas poderiam passar despercebidas. Para isso, articulou o laboratório de travessias com a metodologia das molduras (KILPP, 2003; 2010b; 2015) com a escavação pelo viés da arqueologia da mídia.
“Ah, tem uma repetição, que sempre outras vezes em minha vida acontece. Eu atravesso as coisas – e no meio da travessia não vejo! – só estava era entretido na ideia dos lugares de saída e de chegada. Assaz o senhor sabe: a gente quer passar um rio a nado, e passa; mas vai dar na outra banda é num ponto muito mais embaixo, bem diverso do em que primeiro se pensou. Viver nem não é muito perigoso?”
Guimarães Rosa, 2001
epígrafe da dissertação
Madylene disponibilizou um acesso às travessias que auxiliaram na criação das cartografias da pesquisa:
As imagens de superfície, os sitemaps e a narração da softteller.
Seus procedimentos metodológicos passaram por um outro mapa – conceitual e montado artesanalmente. Ele levou à expressão “cenas de superfície”, montagens de frames extraídos do empírico e que têm relações entre si. O mapa conceitual relacionou imagens do Google Earth e do Eu Sou Amazônia com palavras, ideias e molduras que se destacaram no processo.
Outro conceito importante no arranjo metodológico de Madylene, foi a ideia de softteller. Inspirada em Benjamin, ela propõe o narrar o software, articulando seus procedimentos também ao seus objeto de pesquisa. Desta forma, pode não apenas descrever o que via, mas narrar, articulando o que emergiu do empírico às reflexões que propôs na pesquisa.
“[Diante do computador ligado, com acesso à internet, fazemos uma busca pelo Google Earth, dentre os temas de destaque na ferramenta “Visitante” vemos o Eu sou Amazônia exibindo imagens técnicas de alta qualidade, cheia de cores e movimento. Entramos no projeto, passamos pela tela de apresentação contendo, além do título, a frase “Uma experiência interativa entre você e a floresta” e um convite para se conectar: “Descubra sua conexão”. Vamos para a próxima página que contém 11 temas relacionados à Amazônia, clicamos em um deles, deparamo-nos com vários conteúdos ao mesmo tempo, estamos diante de mídias com a memória da Amazônia em duração e temporalidades coalescentes, então nos perguntamos, para onde ir? Se clicarmos no mapa ele se movimenta, se quisermos ver o conteúdo do vídeo podemos ver junto ao mapa ou apenas o vídeo em tela cheia. Mas também podemos acessar o banco de dados do YouTube. Se quisermos passar para outra página, o conteúdo evolui. Ah, identificamos uma parte do texto sublinhado em azul. Aí está, já não estamos no Eu sou Amazônia e nem no Google Earth, estamos em um outro ambiente que o hipertexto nos levou. Será?]” – p. 94
Como uma estratégia de visualização e “abertura” do seu objeto empírico, Madylene recorre aos sitemaps, que possibilitam a chegada na materialidade do empírico “diante do universo da web, ligada à forma de se deslocar em suas múltiplas páginas”.
As camadas da amazônia audiovisualizada, a interface e o software que se exibe.
A pesquisa proporcionou encontrar três camadas: 1) Amazônia Audiovisualizada, que evoca e atualiza a memória amazônica; 2) o softreader na interface, lugar por onde se chega e se sai; 3) e a falsa opacidade do software, afinal este sempre quer se exibir, seja na forma de Google Earth ou na em outros ambientes, como o banco de dados do Youtube, para o qual o GE pode, eventualmente, direcionar e dar acesso ao softreader.
A pesquisa “NARRATIVIDADE SOFTWARIZADA: travessias no “Eu sou Amazônia”, do Google Earth” de Madylene Costa Barata está integrada ao grupo de pesquisa TCAv (Audiovisualidades e Tecnocultura: comunicação, memória e design). A defesa ocorreu no dia 06 de março de 2020, no campus de São Leopoldo. A banca de avaliação foi composta por Profa. Dra. Milena Szafir (UFCE), Profa. Dra. Sonia Estela Montaño La Cruz (UNISINOS) e Dr. Gustavo Daudt Fischer (Orientador).
A dissertação está disponível no repositório da Unisinos: http://www.repositorio.jesuita.org.br/handle/UNISINOS/9120
Texto: Juliana Koetz
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