O invisível em O Eclipse pelo olhar de Weschenfelder

“Como apreender o invisível em uma imagem?” Com essa pergunta, na função de mediador, o professor Dr. Gustavo Fischer deu início à primeira palestra da XV Semana da Imagem na Comunicação Unisinos, Rastros do invisível no plano cinematográfico. Na noite de segunda-feira, 08 de maio, no LABTICS (Laboratório Avançado de Tecnologias de Informação e Comunicação), o palestrante Ricardo Weschenfelder mostrou aos estudantes de graduação e pós-graduação em Comunicação como fazer isso. A exposição teve como base a sua pesquisa de doutorado, defendida em março de 2016 no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação Unisinos. Assim, além de mostrar o invisível, ofereceu um panorama de sua tese.

Fischer como mediador na Semana da Imagem

Weschenfelder compartilhou o problema de pesquisa, os principais autores e conceitos assim como a metodologia do invisível, as cenas e as análises do filme O Eclipse (1962), do cineasta italiano Michelangelo Antonioni.

Weschenfelder explica o invisível

De modo geral, para o pesquisador, o invisível é apreendido pelo rastro. O rastro evidencia a presença de algo ausente. Ele surge nas imagens – especificamente, nos planos – com a técnica cinematográfica. No filme, o espectador o percebe e o compreende com a ajuda da memória. Weschenfelder, então, queria entender como funciona a relação entre presença e ausência no cinema, considerando tanto a imagem criada pelo cineasta quanto a percepção e a memória do espectador.

Essa dinâmica foi aprofundada teoricamente com Walter Benjamin (rastro e dialética); Hans Ulrich Gumbrecht (produção de presença); Henri Bergson (memória e duração); Jacques Aumont (quadro e fora de quadro); Suzana Kilpp (molduras); Vilém Flusser (superfície) e Georges Didi-Huberman (dialética e releitura sobre Walter Benjamin).

Para autenticar os rastros do invisível em O Eclipse, Weschenfelder propôs a metodologia do invisível. São quatro conceitos que a constituem: olhos ausentes; pontos cegos; (re)quadros; e rotações. Os olhos ausentes correspondem aos olhos do espectador, da câmera ou do cineasta que, por vezes, se ausentam na imagem. Ele explica, “Por exemplo, uma câmera subjetiva, quando o olhar do personagem é o olhar da câmera; então, o olhar do cineasta se ausenta”. Os pontos cegos são pontos ocultos, pontos que ainda não foram vistos pelo espectador. Os (re)quadros são reenquadramentos. “Espelhos, portas, janelas, criando diferentes percepções de molduras, de enquadramentos.” E as rotações são imagens de coisas de fundo que passam ao primeiro plano. Segundo o pesquisador, esses quatro conceitos foram surgindo aos poucos, nas disciplinas do curso de doutorado, no contato com o filme, nas análises.

Para o palestrante, foi uma ousadia inventar a metodologia do invisível, uma vez que partiu da metodologia das molduras, de Suzana Kilpp, a sua orientadora na tese.

“A proposta que eu fiz, a metodologia do invisível, é uma proposta ousada. Ela é baseada nesses conceitos, mas está muito ligada também ao processo de análise das molduras, à metodologia das molduras, da Suzana, de dissecação, de parar o tempo, o fluxo das imagens, no presente para vê-las de outra forma.”

Uma das cenas finais de O Eclipse (1962)

Para evidenciar a produtividade em sua análise, na palestra, Weschenfelder mostrou algumas cenas de O Eclipse. Nas do final do filme, por exemplo, verifica-se, essencialmente, rotação. Aí, Antonioni revelou os espaços nos quais a história se desenvolveu. Segundo o palestrante, ele esvaziou as imagens.

Sobre os olhares lançados às imagens

Além de professor universitário, Ricardo Weschenfelder é realizador audiovisual. Na sua tese, adotou como objeto justamente o cinema. Na linha Mídias e Processos Audiovisuais, na qual ele estava inserido, um dos esforços mais reivindicados é desnaturalizar o olhar. Isso significa ver as imagens de outra forma, desde outras perspectivas. Weschenfelder relatou que sentiu os olhares de realizador e pesquisador se misturarem ao longo da pesquisa.

“Essas coisas estão muito imbricadas. Não conseguiria separar o olhar do realizador e o do pesquisador. As coisas acontecem juntas e misturadas. Isso é importante. Isso talvez ajude a pesquisa, ter esse olhar do realizador. Um olhar que é talvez mais técnico, mais de bastidor, enfim, de produção mesmo. Eu acho que o realizador também ajuda o olhar do pesquisador para reforçar os conceitos.”

Apesar disso, o palestrante reconheceu a necessidade de desnaturalização do olhar e disse que esse esforço estava presente na sua metodologia.

“Nesse processo de análise, da metodologia, já tem o processo de desnaturalizar. A gente tem isso tão presente, tão natural, que tem que ter certo estranhamento nesse sentido para analisar os materiais. Mesmo que exista o afeto.”

Por fim, os conceitos da tese e a experiência de dissecar as imagens do filme de Antonioni em busca de rastros do invisível impactou o trabalho de Ricardo Weschenfelder como realizador audiovisual. Isso tem reverberado de alguma forma em seus filmes.

“Eu consigo na produção como realizador aprofundar mais nos filmes esses conceitos. O próximo filme tem muito a ver com a memória, com o tema da memória. Tem muito a ver com essa memória de rastros de imagem. Quero trabalhar muito com a fusão de imagens. Uma imagem se imbricando na outra. Uma imagem mais abstrata. Tem a ver com as imagens do Antonioni também. Em que passado e presente estão se misturando. Tem muito a ver. Isso que é legal.”

Sobre a sessão de perguntas

No final da palestra, Weschenfelder respondeu as questões de professores e alunos. Assim, os assuntos variaram entre cinema, metodologia utilizada na tese e aplicação da metodologia do invisível em outros filmes, imagens e contextos.


Fotos: Julieth Paula.

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