#TecnometodologiasTCAv: Atmosfera em Amor à flor da pele de Wong Kar Wai, o filme como experiência

Os textos que compõem esta seção constituem uma investigação dos procedimentos técnico-metodológicos utilizados nas pesquisas de mestrado e de doutorado de integrantes e de egressos do Grupo TCAv.

Título do trabalho: Atmosfera em Amor à flor da pele de Wong Kar Wai: o filme como experiência
Nível: Mestrado
Autor: Renata Heinz
Orientadora: Dra. Suzana Kilpp
Ano de defesa: 2013
Link da tese: http://www.repositorio.jesuita.org.br/handle/UNISINOS/4353

Renata Heinz é graduada em Publicidade e Propaganda, com especialização em Cinema e Mestre em Ciências da Comunicação – todos os títulos obtidos pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). Atualmente, a pesquisadora é professora de Direção de Arte para Audiovisual no curso de graduação de Realização Audiovisual na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS).

Em sua dissertação, a pesquisadora focou em problematizar os procedimentos técnicos envolvidos no processo de retratar as atmosferas dentro do espaço fílmico, atentando seu olhar para além das plasticidades gerenciadas dentro do filme, percebendo a interação sensível que tais elementos exercem com o espectador, despertando sensações no mesmo. Como objeto de análise da percepção dessas atmosferas, Renata utilizou o longa-metragem de Wong Kar-wai, “Amor à Flor da Pele (2000)”.

Centrando sua metodologia em uma dissecação bastante minuciosa, para orientar seus movimentos de busca, Renata invoca principalmente os estudos de Inês Gil (2005) acerca da atmosfera como figura fílmica. A partir da distinção feita por Gil (2005) entre a atmosfera concreta – aquela que é material ou criada pela técnica para obter efeitos dramáticos – e atmosfera abstrata – que não é vista diretamente porque não está representada de forma concreta, dando vazão para algo de natureza mais íntima, como sentimentos de dor, amor, medo, solidão -, Renata atribui a sua pesquisa uma organização própria das atmosferas percebidas em seu objeto, dividindo a dissertação em três capítulos distintos: atmosfera na composição de ambientes, atmosferas no estabelecimento das relações e atmosferas na construção do personagem.

Composição de ambientes

Neste primeiro momento, a autora busca ressaltar o próprio espaço que a narrativa se desenrola, com número de locações limitados, tal qual os elementos que performam uma relevância estética na composição dos ambientes – o uso de uma paleta de cor temática (amarelo, roxo, marrom, vermelho, azul e verde), e a forte presença de estampas. A autora destaca também o jogo de luz e sombras presentes nos planos, destacando a presença de luzes diegéticas (iluminação presente em cena) na composição da atmosfera.

Fonte: imagem extraída da dissertação
Fonte: imagem extraída da dissertação

Estabelecimento das relações

Em um segundo momento, a análise se concentra em explorar os elementos que auxiliam na construção da relação dos personagens, utilizando de atmosferas plásticas e dramáticas para traduzir a evolução do envolvimento dos protagonistas, levando até o romance. A autora explora a presença constante de planos fechados, limitando o espaço ocupado pelos corpos em quadro, enfatizando as gestualidades sutis que demonstram o desenvolvimento da relação, junto de elementos sonoros (a presença de uma música-tema) e o uso de slow-motion nos movimentos dos protagonistas que acompanham esses momentos.

Fonte: imagem extraída da dissertação
Fonte: imagem extraída da dissertação

Construção do personagem

Por fim, no último elemento que compõe a dissecação, Renata explora também elementos externos ao filme para observar a construção da atmosfera dos personagens, considerando o processo de preparação do diretor com seus atores no processo, explorando desde a postura corporal até o timbre de voz adotado em cada cena, até a forma misteriosa que o desenvolvimento dos personagens secundários se dá na trama, auxiliando na composição das nuances dos protagonistas de Amor à Flor da Pele.

Fonte: imagem extraída da dissertação

A atmosfera torna os personagens o que devem ser: os escritos do roteiro, os construídos na relação ator e diretor, os mostrados e ouvidos pelas escolhas técnicas. Os personagens são assim marcados pela relação das posições, justaposições, distinções e afastamentos entre os corpos e os ambientes como uma política de sentidos. A conversão visual e sonora evoca uma estrutura de incorporações e confrontos: ainda que os personagens não falem, a atmosfera que emana dos mesmos não cala.

Tendo uma abordagem tecnometodológica que se desdobra na forma em que a autora constrói a discussão da pesquisa, Renata parte do entendimento que o que pesquisa vêm de uma experiência subjetiva. Desse modo, ora executa a análise a partir de seus próprios afetos gerados pelo filme, ora em terceira pessoa, discutindo o que é ouvido e visto no filme, tangendo assim elementos da técnica do filme os quais proporcionam experiências de atmosfera compartilhadas entre qualquer espectador.

Assim, ainda que a análise executada por Renata resulte no desmembramento de diferentes facetas da atmosfera em seu empírico, a autora reitera em sua conclusão a indivisibilidade da ideia que trás sobre a atmosfera. Considerando que este não se trata de um sistema estável e fechado, a pesquisa, ao buscar compreender de que formas a atmosfera é retratada no longa, a autora chega a percepção que o jogo de forças e intensidades inferidos à narrativa acabam por incidir na potência sensorial subjetiva que o longa de Wong Kar-wai provoca em seu espectador.

Texto: Julia Souza

Deixe um comentário